A Tarde - Caderno 2 (18 de agosto de 2000) O grande encontro Momento raro na história da MPB, grandes intérpretes brasileiras reúnem-se, em Salvador, para falar da participação no projeto Caixa Acústica. Harmonia-quase-amor marca o encontro.Ana Paula Guedes A entrevista coletiva realizada no último dia 16, no Sol Vitória Marina, reuniu as cantoras Maria Bethânia, Alcione, Jussara Silveira, Vânia Abreu, Belô Veloso, Noeme Bastos e Margareth Menezes, para falarem sobre a participação no projeto Caixa Acústica. P - Como surgiu a idéia de fazer o projeto? Bethânia - Eu fui convidada para fazer a noite de abertura, amadrinhar o projeto. E fiquei muito alegre, porque eu sempre falo que o Brasil é um país de cantoras. E a Bahia é um Estado generoso. Ela contribui muito para isso. Quando a Luísa me falou que eu poderia convidar quem eu quisesse, falei logo com Alcione. Eu gosto de cantar com ela, de estar perto da voz dela. E as meninas, a Jussara, a Belô e a Vânia, vieram logo na cabeça. Eu quero cantar com elas, com essas vozes que, hoje, já são vozes do Brasil. Acho que cada uma delas tem um estilo, uma escolha, um posicionamento. P - Belô Veloso, como é dividir o palco com Maria Bethânia? Belô - É a primeira vez que piso no palco com a madrinha Bethânia. Estou nervosíssima... Faremos uma homenagem à voz feminina e a ela, também (Bethânia). Não dá para expressar com palavras o que sinto. Ainda mais que tudo isso vai acontecer aqui, na Bahia. P - Jussara, você também vai estar dividindo o palco com Bethânia, Vânia Abreu, Alcione e Belô. O que isto significa, para você? Jussara - A primeira palavra que vem na minha cabeça é sorte. Quando fui convidada por telefone e me disseram que tinha sido convidada por Bethânia, eu disse: quem? E, agora, vendo Bethânia falar tudo isso da gente, eu fico... Bethânia - (interrompe) Eu é que fico arrepiada vendo um ensaio dela (Jussara). Ela tem um frescor! É impressionante! P - Saindo um pouquinho da Bahia, indo agora para o Maranhão, para você, Alcione, como é participar do projeto? Alcione - Eu já tenho sorte há mais tempo do que ela (Jussara). A minha sorte começou há 28 anos. Eu não gosto de falar, porque nós somos da geração Pókemon (risos geral). Já vivemos muito. Arrasamos, na Marquês de Sapucaí (referindo-se a Bethânia). É muito legal participar de um projeto que se volta para ouvir mulheres. Como Bethânia falou, o Brasil é um país de cantoras. E estar dentro da Bahia, onde, praticamente, construí minha carreira... Então, eu acho que eu tinha que estar nesse projeto (brinca). Bethânia - Fui eu quem entregou o primeiro disco de ouro dela (Alcione). P - Bethânia também tem grande influência no seu novo trabalho, não é? Alcione - O meu último disco foi um papo de oito ou dez anos atrás, na casa dela (Bethânia). Ela falava: "Por que você não faz um disco acústico? Você tem uma voz assim". Mas acho que demorei muito tempo para fazer. Eu fiz um disco totalmente na contramão de tudo que já fiz. Liguei para ela, antes, e disse: olha, aquela idéia que você me deu, eu vou fazer agora. Que tal você dirigir o show? Ela disse que não podia, mas me ajudou muito. Eu nunca fui uma cantora de acústica. Até porque não sou nada acústica... P - E você, Vânia, como está sendo a experiência de estar ao lado dessas feras? Vânia - Se me perguntassem "Vânia, o que você preparou para o show?", eu diria: "Meu coração". Ninguém pode imaginar como é ser uma cantora, observar e se emocionar com a voz, as canções do repertório dela (Bethânia)... E, um dia, recebe o convite de cantar com ela. É um encantamento. Quando ela começou a falar, aqui, de como ela observa a nossa carreira, eu, na minha modéstia, sempre acho que a minha carreira não é vista por ninguém. Eu trabalho tanto e as coisas são tão difíceis! Mas eu tenho um trabalho honesto, tão duro, que não tem a força da grana que ergue... Então, o que vale não é orgulho da Vânia Abreu de estar ao lado de Maria Bethânia e Alcione. Mas, finalmente, eu me tornei uma intérprete, que é o que mais quero. Eu toquei uma das maiores intérpretes do Brasil e ela pôde me notar. P - Vânia, dizem que você é uma pessoa detalhista... Vânia - Eu sou detalhista e sou exigente. Ao mesmo tempo que tenho esse jeito muito tranqüilo de lidar com a vida, sou muito exigente comigo, mais do que com qualquer outra pessoa. Eu detesto cantar mal. Se eu não cantar bem aquela música, eu não fico feliz. P - Noeme, você, que batalha cantando nas noites de Salvador, o que significa essa oportunidade em sua carreira? Noeme - Eu sinto o que cada uma delas falou aqui. Talvez até mais, porque é a primeira vez que vejo de perto tantas... Eu recebi o convite no trabalho, eu também sou cabeleireira, e não entendi nada. É um evento de muita coragem. É importante que este projeto continue, trazendo pessoas que, como eu, estão começando a carreira. P - Você vai dividir o palco com uma grande intérprete, a Nana Caymmi. Noeme - Nem me fale... (em tom assustado). Eu acho que cantar com ela vai ser difícil. Bethânia (interrompe) - É fácil. Eu vou tentar tranqüilizá-la... Jussara (completa) - Olha... eu cantei, uma vez, com a Nana, em sua Nota é um Show, e foi muito engraçado. Eu falei para ela: nós vamos participar do mesmo show e eu queria combinar com você. E ela me disse assim: "Cante aí alguma coisa por telefone, puxe o tom". Depois, falou: - É isso mesmo. Eu já vi você cantar. A gente vai cantar nesse tom. A gente se vê lá. Vai ser no olhar -. Foi demais... Bethânia - A Nana é uma das maiores cantoras do Brasil. Eu sempre falei isso. Dalva Oliveira e ela. Noeme - Do jeito que vier, vai rolar (aparentando mais tranqüilidade). Para mim, vai ser uma loteria de trezentos e tantos milhões... P - Margareth, você convidou grandes cantoras para dividir o palco, no próximo dia 20. Qual a sua expectativa sobre o projeto? Margareth - É uma coisa grandiosa para a Bahia, para o Brasil. Acho que é a primeira vez que se reúnem tantas cantoras em prol de um projeto tão bonito. E vou falar uma palavra que Jussara falou, que é a sorte. Essa sorte de a gente pertencer a um país como o Brasil. A sorte de puder buscar vários estilos e influências. Eu tenho um respeito muito grande por Bethânia e Alcione, porque são artistas que ouvi muito na minha formação. |